Se me perguntassem onde gostaria de estar agora, véspera de Natal, não teria dúvida em responder: Assis.
Essa pequena cidade da Úmbria, região central da Itália, no alto de uma colina, é realmente especial. Tive oportunidade de visitá-la há alguns anos, em dezembro. As sensações estão vivas e presentes até hoje. O ar frio e puro, o sol que nos aquecia e iluminava as construções medievais, a calma e o silêncio respeitoso, a contemplação de uma planície tingida de verde a perder de vista.
Foi lá que nasceu Giovanni di Pietro di Bernardone, em 1181. Sua trajetória é conhecida por todos, foi contada de várias formas e ainda exerce fascínio sobre muitos. O pai, um rico e próspero mercador, queria vê-lo à frente dos negócios. Ele acabou abandonando a família e suas posses para cultivar o espírito e ajudar os mais necessitados. Crítico da igreja católica, à época, questionou o papa sobre o acúmulo de riquezas em detrimento das necessidades dos pobres. Atento à desigualdade social ao seu entorno, não mediu esforços para cultivar o bem e o amor, praticando a caridade sem limites. Tornou-se santo.
Francisco tinha profunda devoção ao Natal, que chamava de “festa das festas”. Seu desejo de celebrar a vinda do Cristo o levou, em 1223, a recriar o nascimento de Jesus, dando dimensão humana ao fato histórico.
Resolveu fazer uma encenação, o mais fiel possível, ao momento em que Jesus chegava ao mundo. Queria ver e sentir a emoção, o menino recém-nascido na manjedoura, repousando sobre o feno, com seus pais ao lado, os animais vivos que o aqueciam... A famosa cena bíblica ganhou vida, em uma caverna na região. Pessoas humildes, sem educação formal, que tinham dificuldade em compreender as missas e as liturgias em latim passaram a vivenciar a narrativa católica. Nascia o presépio.
A tradição foi se espalhando pela Itália e, depois, pelo mundo. Diferentes povos passaram a reconstituir, de forma artesanal, a mesma cena de Natal, com estátuas e cenários variados representativos de suas culturas.
Quando visitei Assis, o presépio, em tamanho natural, ficava no gramado em frente à Basílica, onde a palavra PAX está visível no jardim. Hoje, os afrescos do século XIII, que retratam a vida de São Francisco de Assis no teto da igreja, estão projetados nas fachadas históricas do coração da cidade.
O Natal é feito de memórias, especialmente em família. Foi com minha irmã que visitei Assis. Da infância, lembro da devoção da minha avó em montar o presépio com as muitas peças que desembrulhava com todo o cuidado. Adorava ajudar na composição cenográfica. Mais tarde, minha mãe fazia uma versão reduzida, mas linda. As representações feitas pelas figureiras do Vale do Paraíba também me acompanharam pela vida. Foi com essas imagens simples, moldadas em barro, que contei sobre o significado do Natal ao meu filho. E ele, que adorava animais, me pediu para contar de novo, mas só com os bichos! Tudo isso é história. São os afetos que vão sendo impressos em nossos corações e construídos através das gerações. Isso é Natal.
Sim, Assis é onde eu gostaria de estar. Lá, você se sente imerso na energia e nos valores, não só preconizados, mas vivenciados por Francisco - tolerância, respeito à diversidade e ao meio ambiente, exercendo a liderança, a caridade e a inclusão, pelo exemplo.
É um pouco (ou muito) disso tudo que precisamos hoje. Retornar ao essencial, ao simples, ao que é realmente importante e tem significado. Sair dos estímulos ruidosos e vazios, para, em silêncio, honrar e celebrar o amor genuíno e a paz. São Francisco é uma grande inspiração para o mundo atual.
Desejo que, imbuídos deste espírito, possamos ter um ano extraordinário, com grandes descobertas e aprendizados. Que seja doce. Que seja incrível. Feliz 2023.
Linda história de São Francisco de Assis
Que possamos entender o significado verdadeiro do amor pelas coisas simples da vida
Exatamente, Edilene, não poderia concordar mais... simplicidade é tudo.
Blog elegante e atento a contemporaneidade deste tempo que longeva.
Que bom que gostou, José Flávio! Obrigada.